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Estado concedeu incentivos a "toque de caixa" em 2014

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No último trimestre de 2014, a gestão do ex-governador Silval Barbosa (PMDB) concedeu incentivos fiscais a toque de caixa. É o que aponta relatório elaborado pela Controladoria-Geral do Estado (CGE) a pedido da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (Sedec). Conforme o documento, nos meses de outubro, novembro e dezembro 84 empresas foram incluídas no Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso (Prodeic) ou estiveram em vias de ser contempladas com a redução de impostos. Descontando os feriados no período, pode-se dizer que uma empresa por dia esteve na pauta do recebimento do benefício.
O ritmo era tão acelerado que, análise por amostragem de 20 empresas beneficiadas constatou que 40% dos processos não passaram mais de 10 dias entre a carta consulta, primeiro passo para obtenção da redução, e a aprovação do enquadramento. Além disso, os técnicos, que analisaram todo o processo de concessão, verificaram graves irregularidades e pontos críticos nos controles internos da secretaria.
A CGE realizou a verificação da legislação, conversou com servidores que na época eram encarregados dos trâmites, fez um levantamento das informações qualitativas e quantitativas dos processos e analisou os documentos apresentados.
O FLUXO - Antes da análise dos processos, os controladores identificaram como funcionava, ou deveria funcionar o fluxo para a inclusão de empresas no Prodeic. O primeiro passo era a apresentação de carta consulta, juntamente com um parecer técnico, que diria previamente o percentual do benefício a ser concedido, conforme a atividade. O enquadramento era realizado pelo Conselho Estadual de Desenvolvimento Empresarial (Cedem). Elaborava-se o termo de acordo e publicava-se o decreto de enquadramento. Após isso, a empresa entrava na fase de vistoria, com a comprovação dos investimentos previstos na carta consulta, o atendimento dos indicadores e a criação de um laudo.
Apenas depois disso é que os órgãos responsáveis pela arrecadação eram comunicados e um decreto de concessão e fruição editado. A análise constatou que tais procedimentos não eram observados. Em depoimento prestado, um servidor afirmou que, em 2014, o setor recebia os processos para serem analisados momentos antes da reunião deliberativa do Cedem, “não havendo tempo hábil para a realização de uma análise adequada das cartas consulta e demais documentos, como a seriedade do assunto requeria”. Outro servidor reconheceu o aumento considerável no fluxo de empresas e uma mudança no perfil das companhias, com os comércios sendo contemplados com maior incidência.
A LISTA - Uma das primeiras ações da CGE para a elaboração do relatório foi o pedido da relação das empresas beneficiadas durante o último trimestre de 2014. Em resposta, servidores afirmaram que a lista era organizada em uma planilha eletrônica e encaminharam o arquivo. “Identificamos empresas que não constavam na planilha (...), mas que tiveram seus nomes incluídos em decretos de concessão e fruição dos benefícios”, denunciam os auditores.
Para eles, a falha mostra o quão frágil era o controle realizado. Juntamente com as 70 empresas que foram, de fato, beneficiadas, a CGE localizou outras 14 cujo nome fora incluído em minutas de decreto, mas que por algum motivo não chegaram a constar na publicação final. O fato mais grave encontrado pelos auditores nesta fase da investigação dá conta de que 5 empresas, todas com o decreto de inclusão publicado no dia 29 de dezembro de 2014, penúltimo dia útil da gestão anterior, tiveram seus nomes incluídos no decreto sem a devida deliberação do Cedem, que deveria aprovar a vistoria prévia. “Dessa forma, fica claramente evidenciado a irregularidade na inclusão destas empresas”.
CEDEM - O Cedem, conforme o fluxo apresentado pela CGE, era o órgão que deliberava sobre a concessão dos benefícios às empresas que protocolavam cartas consulta. O grupo se reunia trimestralmente. “porém, de acordo com as atas examinadas, desde o início de 2011, realizavam-se reuniões extraordinárias uma vez por mês”.
O aumento no fluxo de trabalho, o não cumprimento dos requisitos previstos em Lei para o trâmite dos processos e a ausência de representantes do governo nas reuniões, causaram o descontrole na concessão dos benefícios. Os técnicos afirmam que em diversos processos entre aqueles analisados, há a ausência de documentos básicos e laudos, mas mesmo assim houve a aprovação por parte do Cedem.
Em alguns casos, a equipe técnica da extinta Secretaria de Indústria, Comércio, Minas e Energia de Mato Grosso (Sicme) atestava que os investimentos não haviam sido executados e, mesmo assim, o processo foi encaminhado ao Cedem, aprovado e remetido para a publicação do decreto.
MUDANÇAS - O novo secretário de Desenvolvimento Econômico, Seneri Paludo, autor do pedido de análise por parte da CGE nos procedimentos do Prodeic, tem tomado medidas no sentido de sanear as irregularidade encontradas. Além da análise minuciosa das 829 empresas que integram o programa de incentivo, ele já anunciou o desenquadramento de algumas empresas cuja atividade não se enquadrava na legislação que regulamenta o assunto.
“Percebemos com esta auditoria falhas em todas as partes do processo. Há incentivos concedidos absolutamente à margem da legalidade”. Entre os setores já analisados há o dos cerealistas, que não podem contar com o benefício e o de serviços, cujas empresas já foram notificadas da irregularidade e, em breve, serão desenquadradas. “Estamos elaborando uma instrução normativa, para juntar todas as informações do processo e dar chance às empresas para se explicarem, além de mudanças na legislação, de forma a dar transparência na concessão destes benefícios e construir um ambiente positivo para o desenvolvimento de Mato Grosso”.